Viciados em videogames e jogos online: que ação psicológica está por trás disso?

Introdução

A geração que numa linguagem sociológica denomina-se geração Z, formada por crianças, adolescentes e jovens nascidos na década de 90 até o ano de 2010 inclui-se, em sua maioria, na população da chamada era digital. Outra considerável parte dessa população é formada pela antecedente geração Y, nascida após 1980, também chamada de geração do milênio,  ou geração da Internet. A estas gerações PALFREY e GASSER chamam de "Nativos Digitais", nascidos "depois de 1980, quando as tecnologias digitais,  como a Usenet  e os Bulletin Board Systems [software para conexão via telefone a um sistema, que antecedeu a internet], chegaram online. Todos eles têm acesso às tecnologias digitais.  E todos têm habilidades para usar essas tecnologias. " (2011, p. 11).
Esses "Nativos Digitais" demonstram intimidade com computadores,  tablets, câmeras,  celulares e aparelhos de TV de última geração. Dominam softwares como fazíamos com os carrinhos de rolimã e pipas. Uma criança de sete - ou menos - anos é capaz de fazer num smartphone coisas surpreendentes a um adulto.

Nem tudo é tão bom quanto parece

Os avanços são tantos e tamanhos que não conseguimos mais imaginar o mundo sem toda essa parafernália tecnológica,  ao mesmo tempo em que não sabemos como será tudo isso daqui a 20 anos.
Os ganhos que tais avanços trazem para a sociedade podem ser muitos, mas é possível que se apresentem em um número menor que seu danos. Um dos ônus entre uma centena é o vício em internet. 
A cada ano,  em muitas culturas, o tempo diante da tela se desloca cada vez mais da TV para a rede e os dispositivos móveis. Em algumas culturas, como a Coréia do Sul, os especialistas acham que o adolescente médio passa duas horas por dia online. Na China, há uma preocupação do público com respeito ao "vício em internet", e os centros que tratam os vícios em álcool e drogas estão abrindo suas portas para este novo influxo de pacientes jovens. (PALFREY e GASSER, pp. 101-2).

Outro vício, mais específico, é em videogames. Na Coréia do Sul, dados de 2008 falavam em 14% de jovens viciados nesta prática. Em 2007, países como Holanda, Alemanha e EUA já tinham centros particulares de tratamento para gamers. No Brasil a gravidade a tempos preocupa pais e autoridades, tanto que em 2007 uma quadrilha sequestrou o melhor jogador do game Gunbound, exigindo como resgate os pontos que ele acumulara nos últimos três anos de jogo,  créditos virtuais avaliados, na ocasião, em R$ 15 mil. (BURGOS, 2008).

Uma explicação na Psicologia

Em um artigo publicado em 2011,  o escritor Guilherme Solari explica que princípios do behaviorismo utilizados nos games levam o jogador a gostar deles sem se dar conta disso. (SOLARI, 2011).

O behaviorismo (de behaviour ou behavior, "conduta") ou psicologia comportamentalista, é uma teoria psicológica desenvolvida a partir do século XX e utilizadada tanto na psicoterapia quanto na educação. Criada pelo russo Pavlov (1849-1936), a teoria behaviorista teve como um de seus expoentes o norte-americano Burrhus Frederic Skinner (1904-1990).

BALLONE (ano ?) destaca que
Para o behaviorismo, o organismo se parece com um responding (um ser respondente) às condições (estímulos), produto de processos ambientais e internos. O objeto da Psicologia tinha sido até então a alma, ou a consciência, a mente. A personalidade para o behaviorista é um conjunto, um sistema de hábitos condicionados através de reforços positivos e negativos. A maior importância é dada aos fatores ambientais e a hereditariedade é relegada para segundo plano.

ARANHA (2006), vai dizer que no behaviorismo "... a aprendizagem se faz quando associamos dois estímulos, em que um deles funciona como reforçador (positivo ou aversivo) de determinada resposta" (p. 162). Ela relata que Skinner fez experiências com pombos e ratos colocados numa caixa adaptada, denominada "caixa de Skinner". Quando estavam famintos os animais esbarravam casualmente numa alavanca que acionava um dispositivo derrubando alimento dentro da caixa. Depois de esbarrar na alavanca várias vezes os bichos descobriam que a ação lhes garantia a comida e passavam a fazê-lo intencionalmente sempre que tinham fome.

Ballone explica o estímulo de reforço dando um exemplo onde "O pai só elogia o filho quando este dá a resposta esperada; o filho, fazendo o desejado pelo pai recebe o prêmio, a recompensa ou reforço positivo. E vai aprendendo a buscar o incentivo positivo com diferentes tipos de comportamento."

Usando um exemplo bem simples no campo da aprendizagem,  quando a professora coloca um adesivo colorido de happy face na atividade da criança, para salientar que o trabalho ficou muito bom, está usando uma espécie de reforço positivo, pois a criança buscará um melhor desempenho nas próximas lições, para garantir novos adesivos.

O reforço positivo dos games

Solari explica em seu artigo sobre os games e o behaviorismo que os videogames fazem isso. Eles reforçam cada ação do jogador para que ele continue jogando mais e mais. "Os grandes objetivos costumam ser recompensados dando mais poder ao usuário, maior capacidade de influenciar o mundo virtual e inimigos mais difíceis". O escritor afirma ainda que "até as pequenas ações de curto prazo precisam ser recompensadas para que o jogo não fique enfadonho, e nesse quesito os gráficos e o som são particularmente importantes".

Desta forma,  ávidos por emoções e trazendo em si uma capacidade como que inata para lidar com as modernas tecnologias, os "Nativos Digitais", como os ratos e pombos da caixa de Skinner, descobrem a forma de matar sua "fome" com os reforços positivos criados pela indústria multinacional dos videogames.

O resultado disso é um número cada vez mais assustador de viciados em videogames e jogos online. PALFREY e GASSER citam que "Uma pesquisa de 2007 encontrou que 8,5% dos jogadores jovens dos Estados Unidos podem ser classificados como patologicamente viciados em videogame." (p. 211).

Conclusão

Pais, educadores, profissionais de ajuda, psicoterapeutas, médicos, autoridades e instituições de diversos fins devem, ao mesmo tempo individual e associadamente, contribuir para a amenização do problema. Acompanhar, avaliar e orientar as chamadas gerações Z e Y, os denominados "Nativos Digitais" sobre os riscos das psicopatologias tecnológicas, que,  somadas a outras psicopatologias minam a sociedade.

Referências
ARANHA,  Maria Lúcia de Arruda.  Filosofia da Educação. São Paulo : Moderna,  2006.
BALLONE,  Geraldo José.  Dicionário de Psiquiatria, verbete Behaviorismo, in Psiqueweb. Disponível em : http://www.psiqweb.med.br/site/DefaultLimpo.aspx?area=ES/VerDicionario&idZDicionario=604
BURGOS, Pedro. Clínica para viciados em videogames. Revista Super Interessante, abril de 2011. Disponível em : http://super.abril.com.br/tecnologia/clinica-viciados-videogame-447466.shtml. Acessado em 06 abr 2015.
PALFREY, John e GASSER, Urs. Nascidos na era digital : entendendo a primeira geração de nativos digitas. Porto Alegre : Artmed, 2011.

SOLARI, Guilherme. Além do jogo : Achievements, Troféus e... Psicologia Comportamental? UOL Jogos, abril de 2011. Disponível em : http://jogos.uol.com.br/ultnot/multi/2011/04/05/alem-do-jogo-achievements-trofeus-psicologia.jhtm. Acessado em 06 abr 2015. 

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